terça-feira, 16 de julho de 2013

A infância que passa e nunca mais recuperamos

Muita gente tem saudades da infância. Dos tempos de criança, das brincadeiras até o sol se pôr. Eu não tenho. Nenhumas.
Fui extremamente infeliz na minha infância. Não cresci num ambiente harmonizado, nem feliz. Cresci num ambiente rodeado de pobreza financeira e mental, violento, pouco seguro e pouco estimulante para uma criança. Não tenho irmãos, nem primos. Estava essencialmente com a minha avó e bisavó, que fizeram tudo o que podiam por mim. A minha avó tinha 2 empregos, chegava tarde a casa, e ainda tinha paciência para brincar comigo, ler-me histórias e adormecer-me, mesmo cansada. Não tive convivência com outras crianças da minha idade, e por isso quando tive, não tinha auto-estima, confiança nem sabia "brincar" como elas. Sempre fui uma criança calada e triste. Não ia à praia ou à piscina com amiguinhos, nunca tive amigos verdadeiros até ao meu secundário, quando comecei a falar mais e a ser mais confiante.
E penso que há coisas que ficam demasiado marcadas em nós e nos moldam para sempre. Eu admito que sou um pouco anti-social. E creio que se deve em boa parte à minha infância e aos traumas que dela resultam.Eu não gosto de grupos grandes, de esperar por pessoas que mal conheço, de partilhar o que é meu e o que consegui com outros que não me dizem nada. Cresci demasiado independente e à "lei da bala" para ser assim.
Eu nunca tive companhia da minha mãe para ir às compras, para ir ao cabeleireiro, para me ensinar a usar maquilhagem, para me dizer o que ficava bem ou não, para se orgulhar em ser minha mãe (durante anos ela disse que era minha irmã, vá-se lá entender...). Nunca tive ajuda para fazer os trabalhos de casa. Ela nunca me limpou as lágrimas depois de um desgosto de amor. Tive a minha avó, que sempre fez tudo o que podia por mim, mas claro que tinha as limitações inerentes à idade, ao facto de ainda trabalhar, e ao facto de não ser uma pessoa que teve educação, que na verdade não teve, começou a trabalhar aos 6 anos e nunca aprendeu a ler e escrever.
E eu... cheguei à conclusão de que um dia que tenha filhos, quero acompanhar a minha filha às compras, quero ajudá-la a dar os primeiros passos, quero ensiná-la a maquilhar-se, a vestir-se adequadamente às situações, a escolher bons livros e bons filmes, a ir a concertos. Quero ensiná-la a conduzir. Quero limpar-lhe as lágrimas sempre que necessário. Quero olhar no espelho e ver uma cara parecida com a minha e com a do pai.
Quero ser mãe um dia. Mesmo.
E este desejo é tão grande que acho que ando a ficar com medos infundados (comum à minha pessoa), e não sei o que seria de mim se não puder vir a ser mãe.

5 comentários:

Maria disse...

Que soco no estomâgo... O que eu senti durante a maior parte da minha vida adulta (sobre a 'falta' da figura materna e relação com a avó). A mim deu-me exactamente para o inverso: filhos? Não obrigada.

Mas cada um é como cada qual! Vais ser uma excelente mãe, no worries! :)

GATA disse...

A tua infância foi o oposto da minha. Eu guardo boas recordações da minha infância e acho, inclusive, que foi a única época em que fui simplesmente feliz.

No entanto, curiosamente, era uma criança tímida. Talvez por não ter irmãos... E fui assim até aos meus 16 anos. Uma injustiça feita pela minha professora de História soltou a fera amansada em mim! :-) Na minha essência, continuo tímida, mas aprendi a defender-me.

Mas tu serás, certamente, boa mãe, e terás muitooos filhotes!!! :-)

A Mocha disse...

oh... que texto comovente. Mas espero que transformes essa experiência infeliz em algo maravilhoso para os teus futuros filhos. Serás daquelas mães que darão valor a cada bocadinho (por mais insignifcante que seja aos olhos dos outros) com eles. Desejo-te boa sorte, que consigas ser mãe e uma mãe ternurenta e atenta :)

Lois Lane disse...

Com um relato desses, e com o restante que fui lendo de ti, acho que hoje deves estar muito orgulhosa de tudo aquilo que alcançaste. Tenho a certeza de que vais conseguir muito mais! :)

Imperatriz Sissi disse...

Acho que a Bomboca vai dar uma mãe óptima. Nada de preocupações, que as crianças aparecem quando menos se espera...Revejo-me nisso de ser anti social, porque brincava essencialmente com o meu irmão e os meus primos. Estimulou-me a imaginação, aprendi a ser muito independente mas houve uma certa "agilidade social" que só aprendi com o tempo.