segunda-feira, 1 de julho de 2013

O culto do sair tarde em Portugal

Eu cumpro os deadlines. Eu sou eficiente durante o dia, ou procuro ser. Eu considero que faço uma boa gestão do meu tempo. Por isso, gosto, quando tal me é permitido (quase nunca, dada a carga de trabalho a que estou sujeita), de sair a horas. Faço a gestão do que tenho a fazer, e o que não se fez hoje pode fazer-se amanhã, caso não seja urgente. Mas a mentalidade portuguesa não é assim. A mentalidade portuguesa inibe os que gostam de sair a horas. Os que cumprem com o seu trabalho dentro do horário definido. O que normalmente acontece a essas pessoas, vendo pelo meu exemplo, é que quando acabam o que tinham para fazer, e já está na hora de saída, antes que essas pessoas possam sair, é-lhes dado mais trabalho. E mais coisas para fazer. Porque sair cedo não faz parte das regras generalizadamente aceites em Portugal. Fica "bem" sair tarde. Pode andar-se a pastar o dia todo, mas é importante sair depois do chefe. É importante o chefe resolver vir ao open space e estar muita gente, independentemente da hora que for.
Tenho um colega que durante o dia nunca está na sua secretária. Ou vai fumar, ou vai dar duas de letra, ou vai tomar café. Enfim, o que ele vai fazer não importa, o essencial é que ele nunca está no seu sítio. Mas é sempre dos últimos a sair. E os superiores gostam dele. Não digo que seja um mau profissional, mas a verdade é que, acabando por trabalhar provavelmente as 8h do horário, está no local de trabalho 12h. E eu, que trabalho 10h, por exemplo, e queria estar 10h, sou obrigada a estar 11h, 12h, ou mais. E a trabalhar essas horas porque não gosto de estar a pastar no trabalho. Eu, e outros como eu.
Hoje, estou a pastar. À espera que uma excelência reúna comigo.
Porque que interessa se não há deadlines e se passou a hora de saída? O trabalhador tem de estar sempre disponível. Ponto final.
É essa a mentalidade portuguesa, que penaliza quem procura sair à sua hora, e vangloria quem gosta de sair tarde, independentemente do número de horas efectivamente trabalhadas.
Nos Estados Unidos, um jovem português foi alvo de desconfianças por parte do seu superior, que mandou vigiar a sua conta de email e telefonemas. A razão? Ele saía mais tarde do que o que horário de trabalho previa, sem qualquer remuneração extra, o que causou estranheza e suspeitas de espionagem industrial. Passou-se algo semelhante na Alemanha. Pelo parco conhecimento que tenho dos hábitos laborais noutros países, arrisco-me a dizer que estes comportamentos só ocorrem por cá. É daquelas coisas tipicamente nossas. Que eu odeio, diga-se.

6 comentários:

Soninha disse...

Como eu te compreendo...

Karina sem acento disse...

Por aqui, também não há muito o culto de se sair mais tarde. Às sextas-feiras então, às 16h30/17h já ninguém está no local de trabalho. E em muitos sítios é normal oferecerem dias de férias quando é necessário fazer-se noitadas ou trabalhar aos fins-de-semana.

Eu até nem me podia queixar muito, quando estava a trabalhar em Lisboa. A minha hora de saída era às 19h e no máximo, saía às 19h30. Mas também não gastava uma hora e meia de almoço, aproveitava para despachar trabalho. Preferia do que ficar até mais tarde a trabalhar.

Jovem $0nhador@ disse...

Comecei agora a trabalhar numa empresa e reparo que toda a gente sai depois da hora...por enquanto tenho saído a horas mas estou a ver que daqui a uns tempos já não será assim...Também acho que não está correto, mas é o país que temos e dificilmente muda...

teardrop disse...

Ainda recentemente falava sobre isso com o meu querido. Não podia concordar mais contigo!

CM disse...

Nem mais, Bomboca. Em Portugal, as pessoas que cumprem o horário de saída, são olhadas de lado. São os preguiçosos. São os que querem fazer o mínimo possível. Não passa pela cabeça de ninguém que são os que deram o litro durante o período em que é suposto isso acontecer...

Anónimo disse...

Concordo plenamente. Sinto-o no dia-a-dia também!